Nota de Imprensa
Melhor imagem de sempre de galáxias em fusão no Universo longínquo
ALMA aplica métodos de Sherlock Holmes
26 de Agosto de 2014
Com o auxílio do Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), e de outros telescópios instalados no solo e no espaço, uma equipa internacional de astrónomos obteve a melhor imagem de sempre de uma colisão entre duas galáxias quando o Universo tinha apenas metade da sua idade atual. A equipa usou uma lupa do tamanho de uma galáxia para ver detalhes que de outro modo seriam impossíveis de detectar. Este novo estudo da galáxia H-ATLAS J142935.3-002836 mostrou que este objeto complexo e distante se parece com as Galáxias Antena, um sistema local em colisão bem conhecido.
O famoso detective Sherlock Holmes usava uma lupa para descobrir as pistas quase invisíveis mas importantes dos seus casos. Do mesmo modo, os astrónomos combinaram o poder de muitos telescópios na Terra e no espaço [1] com uma enorme lupa cósmica para estudar um caso de formação estelar vigorosa no Universo primordial.
“Embora os astrónomos se encontrem normalmente limitados pelo poder dos seus telescópios, em alguns casos a nossa capacidade de observar detalhes é aumentada por lentes naturais criadas pelo Universo,” explica o autor principal do estudo Hugo Messias da Universidad de Concepción (Chile) e do Centro de Astronomia e Astrofísica da Universidade de Lisboa (Portugal). “Einstein previu na sua teoria da relatividade geral que, dada bastante massa, a luz não viaja em linha recta mas curvará, da mesma maneira que é refractada por uma lente normal.”
Estas lentes cósmicas são criadas por estruturas massivas como galáxias ou enxames de galáxias, as quais defletem a luz dos objetos que se encontram por trás, devido à sua forte gravidade - um efeito chamado lente gravitacional. As propriedades de ampliação deste efeito permitem aos astrónomos estudar objetos que, de outro modo, não seriam visíveis e comparar diretamente galáxias locais com outras muito mais remotas, observadas quando o Universo era significativamente mais novo.
No entanto, para que estas lentes gravitacionais funcionem, a galáxia lente e a que se encontra por trás dela devem estar precisamente alinhadas.
“Estes alinhamentos ocasionais são bastante raros e tendem a ser difíceis de identificar,” acrescenta Hugo Messias, “no entanto, estudos recentes mostraram que observando nos comprimentos de onda do infravermelho longínquo e do milímetro conseguimos encontrar estes casos de forma mais eficaz.”
A H-ATLAS J142935.3-002836 (ou apenas H1429-0028, para simplificar) trata-se de uma destas fontes e foi encontrada pelo rastreio H-ATLAS (sigla inglesa para Herschel Astrophysical Terahertz Large Area). Apesar de muito ténue em imagens no visível, esta galáxia encontra-se entre as mais brilhantes encontradas até à data ampliadas gravitacionalmente no infravermelho longínquo, embora a estejamos a observar numa altura em que o Universo tinha apenas metade da sua idade atual.
O estudo deste objeto encontrava-se no limite do que é possível, levando a que uma equipa internacional começasse uma campanha de observação extensa utilizando os telescópios mais poderosos - instalados tanto no solo como no espaço - incluindo o Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA, o ALMA, o Observatório Keck, o Karl Jansky Very Large Array (JVLA), entre outros. Os diferentes telescópios forneceram diferente informação, que foi posteriormente combinada e permitiu obter o melhor conhecimento conseguido até à data sobre a natureza deste objeto tão invulgar.
As imagens Hubble e Keck revelaram um anel de luz detalhado, induzido gravitacionalmente, em torno da galáxia situada em primeiro plano. Estas imagens de alta resolução mostraram igualmente que a galáxia lente é uma galáxia de disco vista de perfil - semelhante à nossa própria Galáxia, a Via Láctea - a qual obscurece parte da radiação do campo de fundo devido às enormes nuvens de poeira que contém.
No entanto, este obscurecimento não é problemático nem para o ALMA nem para o JVLA, uma vez que estes dois observatórios observam a comprimentos de onda maiores, imunes à poeira. Utilizando os dados combinados, a equipa descobriu que o sistema mais distante se tratava efetivamente de duas galáxias em processo de colisão. A partir desse momento, tanto o ALMA como o JVLA desempenharam um papel fundamental na caracterização do objeto.
Em particular, o ALMA observou a radiação da molécula de monóxido de carbono, a qual permite fazer estudos detalhados dos mecanismos de formação estelar nas galáxias. As observações ALMA permitiram também fazer a medição do movimento do material no sistema de fundo, verificando-se assim que o objeto estava realmente a sofrer colisão galáctica e a formar centenas de novas estrelas por ano. Uma das galáxias em colisão mostra ainda sinais de rotação: uma indicação de que se tratava de uma galáxia de disco antes do encontro.
O sistema destas duas galáxias em colisão assemelha-se a um objeto que se encontra muito mais perto de nós: as Galáxias Antena. Trata-se de uma colisão espetacular entre duas galáxias, que se pensa que teriam estrutura de disco no passado. Enquanto o sistema Antena forma estrelas a uma taxa de apenas algumas dezenas de massas solares por ano, o sistema H1429-0028 transforma mais de 400 vezes da massa do Sol de gás em novas estrelas todos os anos.
Rob Ivison, Diretor de Ciência do ESO e co-autor do novo estudo conclui: “O ALMA permitiu-nos resolver esta questão porque nos deu informação acerca da velocidade do gás nas galáxias, informação esta que permitiu separar os diversos componentes, revelando a assinatura clássica de uma fusão de galáxias. Este estudo apanhou a fusão no momento em que esta começa a dar origem a um episódio extremo de formação estelar.”
Notas
[1] Entre os telescópios utilizados neste estudo encontravam-se três do ESO - ALMA, APEX e VISTA. Os outros telescópios e rastreios usados foram: o Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA, o telescópio Gemini South, o telescópio Keck-II, o Telescópio Espacial Spitzer da NASA, a rede Jansky Very Large Array, CARMA, IRAM, SDSS e WISE.
Informações adicionais
O Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), uma infraestrutura astronómica internacional, é uma parceria entre a Europa, a América do Norte e o Leste Asiático, em cooperação com a República do Chile. O ALMA é financiado na Europa pelo Observatório Europeu do Sul (ESO), na América do Norte pela Fundação Nacional para a Ciência dos Estados Unidos (NSF) em cooperação com o Conselho Nacional de Investigação do Canadá (NRC) e no Leste Asiático pelos Institutos Nacionais de Ciências da Natureza (NINS) do Japão em cooperação com a Academia Sínica (AS) da Ilha Formosa. A construção e operação do ALMA é coordenada pelo ESO, em prol da Europa, pelo Observatório Nacional de Rádio Astronomia (NRAO), que é gerido, pela Associação de Universidades (AUI), em prol da América do Norte e pelo Observatório Astronómico Nacional do Japão (NAOJ), em prol do Leste Asiático. O Observatório ALMA (JAO) fornece uma liderança e direção unificadas na construção, gestão e operação do ALMA.
Este trabalho foi apresentado num artigo científico intitulado “Herschel-ATLAS and ALMA HATLAS J142935.3-002836, a lensed major merger at redshift 1.027”, de Hugo Messias et al., que será publicado online na revista da especialidade Astronomy & Astrophysics a 26 de agosto de 2014.
A equipa é composta por Hugo Messias (Universidad de Concepción, Barrio Universitario, Chile; Centro de Astronomia e Astrofísica da Universidade de Lisboa, Portugal), Simon Dye (School of Physics and Astronomy, University of Nottingham, RU), Neil Nagar (Universidad de Concepción, Barrio Universitario, Chile), Gustavo Orellana (Universidad de Concepción, Barrio Universitario, Chile), R. Shane Bussmann (Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics, EUA), Jae Calanog (Department of Physics & Astronomy, University of California, EUA), Helmut Dannerbauer (Universität Wien, Institut für Astrophysik, Áustria), Hai Fu (Astronomy Department, California Institute of Technology, EUA), Edo Ibar (Pontificia Universidad Católica de Chile, Departamento de Astronomía y Astrofísica, Chile), Andrew Inohara (Department of Physics & Astronomy, University of California, EUA), R. J. Ivison (Institute for Astronomy, University of Edinburgh, Royal Observatory, RU; ESO, Garching, Alemanha), Mattia Negrello (INAF, Osservatorio Astronomico di Padova, Itália), Dominik A. Riechers (Astronomy Department, California Institute of Technology, EUA; Department of Astronomy, Cornell University, EUA), Yun-Kyeong Sheen (Universidad de Concepción, Barrio Universitario, Chile), Simon Amber (The Open University, Milton Keynes, RU), Mark Birkinshaw (H. H. Wills Physics Laboratory, University of Bristol, RU; Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics, EUA), Nathan Bourne (School of Physics and Astronomy, University of Nottingham, RU), Dave L. Clements (Astrophysics Group, Imperial College London, RU), Asantha Cooray (Department of Physics & Astronomy, University of California, EUA; Astronomy Department, California Institute of Technology, EUA), Gianfranco De Zotti (INAF, Osservatorio Astronomico di Padova, Itália), Ricardo Demarco (Universidad de Concepción, Barrio Universitario, Chile), Loretta Dunne (Department of Physics and Astronomy, University of Canterbury, Nova Zelândia; Institute for Astronomy, University of Edinburgh, Royal Observatory, RU), Stephen Eales (School of Physics and Astronomy, Cardiff University,RU), Simone Fleuren (School of Mathematical Sciences, University of London, RU), Roxana E. Lupu (Department of Physics and Astronomy, University of Pennsylvania, EUA), Steve J. Maddox (Department of Physics and Astronomy, University of Canterbury, Nova Zelândia; Institute for Astronomy, University of Edinburgh, Royal Observatory, RU), Michał J. Michałowski (Institute for Astronomy, University of Edinburgh, Royal Observatory, RU), Alain Omont (Institut d’Astrophysique de Paris, UPMC Univ. Paris, França), Kate Rowlands (School of Physics & Astronomy, University of St Andrews, RU), Dan Smith (Centre for Astrophysics Research, Science & Technology Research Institute, University of Hertfordshire, RU), Matt Smith (School of Physics and Astronomy, Cardiff University, RU) e Elisabetta Valiante (School of Physics and Astronomy, Cardiff University, RU).
O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é financiado por 15 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera o Very Large Telescope, o observatório astronómico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. O ESO encontra-se a planear o European Extremely Large Telescope, E-ELT, um telescópio de 39 metros que observará na banda do visível e do infravermelho próximo. O E-ELT será “o maior olho do mundo virado para o céu”.
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Sobre a Nota de Imprensa
Nº da Notícia: | eso1426pt |
Nome: | H-ATLAS J142935.3-002836 |
Tipo: | Early Universe : Galaxy : Type : Gravitationally Lensed |
Facility: | Atacama Large Millimeter/submillimeter Array, Atacama Pathfinder Experiment, CARMA, Gemini Observatory, Hubble Space Telescope, Spitzer Space Telescope, Visible and Infrared Survey Telescope for Astronomy |
Science data: | 2014A&A...568A..92M |