Nota de Imprensa
Despedaçada por um buraco negro
VLT observa em directo uma nuvem de gás a aproximar-se o mais possível do monstro que vive no centro da Via Láctea
17 de Julho de 2013
Novas observações obtidas com o Very Large Telescope do ESO mostram pela primeira vez uma nuvem de gás a ser despedaçada pelo buraco negro de massa extremamente elevada que se encontra no centro da nossa Galáxia. A nuvem está tão esticada que a sua parte da frente já passou pelo ponto mais próximo e desloca-se agora para longe do buraco negro a mais de 10 milhões de quilómetros por hora, enquanto a cauda da nuvem ainda se encontra a cair em direção ao buraco negro.
Em 2011 o Very Large Telescope do ESO (VLT) descobriu uma nuvem de gás com várias vezes a massa da Terra a acelerar em direção ao buraco negro que se encontra no centro da Via Láctea (eso1151) [1]. Esta nuvem está agora a efectuar a sua máxima aproximação a este objeto e as novas observações VLT mostram que a nuvem está a ser esticada pelo campo gravitacional extremo do buraco negro.
“O gás que se encontra à cabeça da nuvem está esticado ao longo de mais de 160 mil milhões de quilómetros em torno do ponto da órbita mais próximo do buraco negro. E o ponto de maior aproximação está a apenas um pouco mais do que 25 mil milhões de quilómetros de distância do buraco negro propriamente dito - por pouco não caindo lá para dentro,” explica Stefan Gillessen (Instituto Max Planck de Física Extraterrestre, Garching, Alemanha), que liderou a equipa de observação [2]. “A nuvem está tão esticada que atingir o ponto de maior aproximação ao buraco negro é um processo que dura, não apenas um instante, mas um longo período de pelo menos um ano.”
À medida que a nuvem de gás se estica, a sua radiação torna-se mais difícil de observar. Mas utilizando o instrumento SINFONI montado no VLT, para observar a região próxima do buraco negro durante mais de 20 horas de exposição - a exposição mais profunda alguma vez feita a esta região com um espectrógrafo de campo integral [3] - a equipa conseguiu medir as velocidades das diferentes partes da nuvem à medida que esta se aproxima o máximo possível do buraco negro central [4].
“O mais excitante que vemos nestas novas observações é a cabeça da nuvem a deslocar-se outra vez na nossa direção, ao longo da órbita, a mais de 10 milhões km/h - cerca de 1% da velocidade da luz,” acrescenta Reinhard Genzel, líder do grupo de investigação que estuda esta região há quase vinte anos. “O que significa que a parte dianteira da nuvem já passou pelo ponto da órbita mais próximo do buraco negro.”
A origem da nuvem de gás permanece um mistério, embora não haja falta de ideias sobre este assunto [5]. As novas observações diminuem, no entanto, as possibilidades.
“Tal como um desafortunado astronauta num filme de ficção científica, vemos que a nuvem está a ficar tão esticada que parece um esparguete, o que quer dizer que provavelmente não terá uma estrela no seu interior,” conclui Gillessen. “Neste momento pensamos que o gás veio muito provavelmente das estrelas que orbitam o buraco negro.”
O culminar deste evento cósmico único no centro da nossa Galáxia está a acontecer e a ser observado de perto por astrónomos em todo o mundo. A extensa campanha de observação fornecerá imensos dados, não apenas revelando mais sobre a nuvem de gás [6], mas também observando as regiões próximas do buraco negro, as quais não tinham ainda sido estudadas anteriormente, e os efeitos da gravidade extremamente elevada.
Notas
[1] Estima-se que o buraco negro no centro da Via Láctea, conhecido pelo nome formal de Sgr A* (Sagitário A asterisco), tenha uma massa de cerca de quatro milhões de vezes a da Sol. É, claramente, o buraco negro de massa extremamente elevada mais próximo de nós, sendo por isso o mais adequado para estudar detalhadamente os buracos negros. O estudo deste buraco negro e do seu meio circundante está listado em primeiro lugar nas Dez Descobertas Astronómicas Principais do ESO.
[2] A distância da maior aproximação corresponde a cerca de cinco vezes a distância Neptuno - Sol, o que é realmente muito próximo para um buraco negro com uma massa de quatro milhões de vezes a do Sol!
[3] Num espectrógrafo de campo integral a radiação colectada em cada pixel é separada individualmente nas suas componentes de cor, e por isso a cada pixel corresponde um espectro. Estes espectros são seguidamente analisados individualmente e usados para, por exemplo, criar mapas da velocidade e das propriedades químicas de cada parte do objeto observado.
[4] A equipa espera também encontrar evidências de como a nuvem em movimento rápido interage com o gás existente no meio em torno do buraco negro. Até agora ainda nada foi encontrado, mas estão a ser planeadas observações para ver estes efeitos.
[5] Os astrónomos pensam que a nuvem de gás possa ter sido criada por ventos estelares emitidos por estrelas que orbitam o buraco negro. Ou pode também ser o resultado de um jacto emitido a partir do centro galáctico. Outra opção era a de uma estrela estar no centro da nuvem e neste caso o gás viria, ou de um vento desta estrela, ou de um disco planetário de gás e poeira que se encontrasse em redor da estrela.
[6] À medida que este fenómeno se desenrola no centro da Galáxia, os astrónomos esperam ver a evolução da nuvem a mudar de efeitos puramente gravitacionais e de maré para efeitos turbulentos relacionados com hidrodinâmica complexa.
Informações adicionais
Este trabalho foi descrito num artigo científico "Pericenter passage of the gas cloud G2 in the Galactic Center", de S. Gillessen et al., que será publicado na revista da especialidade Astrophysical Journal.
A equipa é composta por S. Gillessen (Instituto Max Planck Institute de Física Extraterrestre, Garching, Alemanha [MPE]), R. Genzel (MPE; Departmento de Física e Astronomia, Universidade da Califórnia, Berkeley, EUA), T. K. Fritz (MPE), F. Eisenhauer (MPE), O. Pfuhl (MPE), T. Ott (MPE), M. Schartmann (Universitätssternwarte der Ludwig-Maximilians-Universität, Munique, Alemanha [USM]; MPE), A. Ballone (USM; MPE) e A. Burkert (USM; MPE).
O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é financiado por 15 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera o Very Large Telescope, o observatório astronómico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. O ESO encontra-se a planear o European Extremely Large Telescope, E-ELT, um telescópio de 39 metros que observará na banda do visível e do infravermelho próximo. O E-ELT será “o maior olho no céu do mundo”.
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Sobre a Nota de Imprensa
Nº da Notícia: | eso1332pt |
Nome: | Milky Way, Milky Way Galactic Centre, Sgr A* |
Tipo: | Milky Way : Galaxy : Component : Central Black Hole |
Facility: | Very Large Telescope |
Science data: | 2013ApJ...774...44G |