Nota de Imprensa
Surpreendente estrutura espiral descoberta pelo ALMA
Novas observações revelam segredos de uma estrela moribunda
10 de Outubro de 2012
Os astrónomos descobriram uma estrutura em espiral totalmente inesperada na matéria que circunda a estrela velha R Sculptoris, com a ajuda do Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA). Esta é a primeira vez que uma tal estrutura, juntamente com uma concha esférica exterior, é encontrada em torno de uma estrela gigante vermelha. É também a primeira vez que os astrónomos conseguem obter informação completa a três dimensões de uma tal espiral. A estranha forma foi provavelmente criada por uma estrela companheira escondida, que orbita a gigante vermelha. Este trabalho é um dos primeiros resultados científicos do ALMA a ser publicado e sairá esta semana na revista Nature.
Uma equipa de astrónomos, utilizando o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), o mais poderoso telescópio milimétrico/submilimétrico do mundo, descobriu uma estrutura em espiral surpreendente no gás que rodeia a estrela gigante vermelha R Sculptoris [1][2][3]. Este facto significa que existe provavelmente uma estrela companheira que orbita a estrela, mas que nunca foi vista anteriormente [4]. Os astrónomos ficaram igualmente surpreendidos ao descobrir que a gigante vermelha ejetou muito mais material do que o esperado.
"Já tínhamos visto anteriormente conchas em torno de estrelas deste tipo, mas esta é a primeira vez que vemos uma espiral de matéria a sair da estrela, juntamente com a concha circundante," diz o autor principal do artigo científico que descreve os resultados, Matthias Maercker (ESO e Instituto de Astronomia Argelander, Universidade de Bona, Alemanha).
Uma vez que ejetam grandes quantidades de matéria, as gigantes vermelhas, como a R Sculptoris, contribuem imenso para a poeira e gás que constituem a matéria prima na formação de futuras gerações de estrelas, sistemas planetários e consequentemente vida.
Mesmo na fase de Ciência Preliminar, quando estas novas observações foram obtidas, o ALMA distanciou-se logo em termos de qualidade dos outros observatórios submilimétricos. As observações preliminares mostraram claramente uma concha esférica em torno da R Sculptoris, mas nem a estrutura em espiral nem a companheira foram observadas.
"Quando observámos a estrela com o ALMA, nem metade das antenas estavam ainda operacionais. É realmente excitante imaginar o que a rede ALMA completa conseguirá observar quando estiver terminada em 2013", acrescenta Wouter Vlemmings (Universidade de Tecnologia Chalmers, Suécia), co-autor do estudo.
No final das suas vidas, as estrelas com massas até oito massas solares transformam-se em gigantes vermelhas e libertam enormes quantidades de massa sob a forma de um denso vento estelar. Durante a fase de gigante vermelha, as estrelas sofrem periodicamente pulsações térmicas. Este fenómeno corresponde a fases de curta duração, em que se verificam explosões de combustão de hélio na concha que envolve o núcleo estelar. Uma pulsação térmica faz com que a matéria seja expelida para fora da estrela a uma taxa muito elevada, o que origina a formação de uma grande concha de poeira e gás em torno da estrela. Depois da pulsação, a taxa à qual a estrela perde massa volta ao seu valor normal.
As pulsações térmicas ocorrem aproximadamente a cada 10 000 - 50 000 anos, durando apenas algumas centenas de anos. As novas observações da R Sculptoris mostram que esta estrela sofreu uma pulsação térmica há cerca de 1800 anos, a qual durou cerca de 200 anos. A estrela companheira moldou o vento da R Sculptoris em forma espiral.
"Ao aproveitar o poder do ALMA para observar pequenos detalhes, podemos compreender muito melhor o que acontece à estrela antes, durante e depois da pulsação térmica, através do estudo da forma da concha e da estrutura em espiral," diz Maercker. "Sempre esperámos que o ALMA nos desse uma nova visão do Universo, mas estar já a descobrir coisas novas inesperadas, com uma das primeiras configurações de observação é verdadeiramente excitante."
De modo a descrever a estrutura observada em torno da R Sculptoris, a equipa de astrónomos correu simulações de computador para seguir a evolução de um sistema binário [5]. Estes modelos ajustam muito bem as novas observações do ALMA.
"É um verdadeiro desafio tentar descrever de forma teórica todos os detalhes observados pelo ALMA, mas os nossos modelos de computador mostram que estamos realmente no caminho certo. O ALMA está a dar-nos novas pistas sobre o que se passa nestas estrelas e o que pode acontecer ao Sol daqui a alguns milhares de milhões de anos," diz Shazrene Mohamed (Instituto de Astronomia Argelander, Bona, Alemanha e Observatório Astrónomico da África do Sul), co-autor do estudo.
"Num futuro próximo, observações de estrelas como a R Sculptoris pelo ALMA ajudar-nos-ão a compreender como é que os elementos de que somos constituídos chegaram a locais como a Terra. Dar-nos-ão também uma pista de como é que o futuro longínquo da nossa própria estrela poderá ser," conclui Matthias Maercker.
Notas
[1] R Sculptoris é o exemplo de uma estrela que se encontra no ramo assimptótico das gigantes (AGB, sigla do inglês). São estrelas com massas iniciais entre as 0.8 e 8 massas solares, que se encontram nos últimos estádios das suas vidas. São gigantes vermelhas frias que apresentam acentuada perda de massa sob a forma de fortes ventos estelares e são tipicamente variáveis de longo período. A sua estrutura consiste num pequeníssimo núcleo central de carbono e oxigénio, rodeado por uma concha em combustão de hélio e hidrogénio, seguida de um enorme envelope convectivo. O Sol irá eventualmente evoluir para a fase de estrela AGB.
[2] A concha ejectada que se forma em torno das estrelas AGB é composta por gás e grãos de poeira. Os grãos de poeira podem ser encontrados ao procurar emissão térmica, emissão esta que vai desde o infravermelho longínquo até aos comprimentos de onda do milímetro. No milímetro a emissão que vem da molécula de CO permite aos astrónomos obter mapas de alta resolução da emissão de gás proveniente dos fortes ventos estelares gerados pelas estrelas AGB. Estas observações traçam também, de forma excelente, a distribuição do gás em torno destes objetos. A alta sensibilidade do ALMA torna possível obter diretamente imagens da zona de condensação da poeira e da estrutura do material em torno das estrelas AGB, mostrando detalhes mais pequenos que 0.1 segundos de arco.
[3] Uma estrutura em espiral similar, mas sem a concha circundante, foi observada pelo Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA da estrela LL Pegasi. No entanto, ao contrário das novas observações do ALMA, estes dados não permitiram que a estrutura 3D completa fosse estudada. As observações do Hubble detectam a poeira, enquanto que as do ALMA detectam a emissão molecular.
[4] Binários não observados foram também propostos como explicação das formas estranhas observadas em objetos relacionados, as nebulosas planetárias. Depois da fase AGB, as estrelas de massa baixa e intermédia (0.8 - 8 massas solares) acabam as suas vidas dando origem a uma nebulosa planetária. Estes objetos são os restos brilhantes do envelope estelar de gás ejetado durante a fase AGB, o qual é ionizado pela radiação ultravioleta emitida estrela central. Muitas nebulosas planetárias têm morfologias extremamente complexas e variadas. Estrelas centrais binárias, discos estelares e campos magnéticos foram sugeridos como mecanismos que produzem tal variedade de formas.
[5] O sistema aqui modelizado consiste numa estrela primária AGB em pleno processo de pulsação térmica e numa pequena estrela companheira. A separação entre as estrelas utilizada na simulação é de 60 unidades astronómicas, com uma massa total do sistema de 2 massas solares. O período orbital é de 350 anos.
Informações adicionais
Este trabalho foi apresentado num artigo científico, "Unexpectedly large mass loss during the thermal pulse cycle of the red giant star R Sculptoris", por Maercker et al. que será publicado na revista Nature.
A equipa é composta por M. Maercker (ESO; Instituto de Astronomia Argelander, Universidade de Bona, Alemanha), S. Mohamed (Instituto de Astronomia Argelander; Observatório Astronómico da África do Sul, África do Sul), W. H. T. Vlemmings (Observatório Espacial Onsala, Universidade de Tecnologia Chalmers, Onsala, Suécia), S. Ramstedt (Instituto Argelander), M. A. T. Groenewegen (Observatório Real da Bélgica, Bruxelas, Bélgica), E. Humphreys (ESO), F. Kerschbaum (Departamento de Astronomia, Universidade de Viena, Áustria), M. Lindqvist (Observatório Espacial Onsala), H. Olofsson (Observatório Espacial Onsala), C. Paladini (Departamento de Astronomia, Universidade de Viena, Áustria), M. Wittkowski (ESO), I. de Gregorio-Monsalvo (Joint ALMA Observatory, Chile) e L. A. Nyman (Joint ALMA Observatory).
O ano de 2012 marca o quinquagésimo aniversário da fundação do Observatório Europeu do Sul (ESO). O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é financiado por 15 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera o Very Large Telescope, o observatório astronómico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. O ESO encontra-se a planear o European Extremely Large Telescope, E-ELT, um telescópio de 39 metros que observará na banda do visível e próximo infravermelho. O E-ELT será "o maior olho no céu do mundo".
O Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA), uma infraestrutura astronómica internacional, é uma parceria entre a Europa, a América do Norte e o Leste Asiático, em cooperação com a República do Chile. O ALMA é financiado na Europa pelo Observatório Euroepu do Sul (ESO), na América do Norte pela Fundação Nacional para a Ciência dos Estados Unidos (NSF) em cooperação com o Conselho Nacional de Investigação do Canadá (NRC) e no Leste Asiático pelos Institutos Nacionais de Ciências da Natureza (NINS) do Japão em cooperação com a Academia Sínica (AS) da Ilha Formosa. A construção e operação do ALMA é coordenada pelo ESO, em prol da Europa, pelo Observatório Nacional de Rádio Astronomia (NRAO), que é gerido, pela Associação de Universidades (AUI), em prol da América do Norte e pelo Observatório Astronómico Nacional do Japão (NAOJ), em prol do Leste Asiático. O Joint ALMA Observatory (JAO) fornece uma liderança e direção unificadas na construção, comissionamento e operação do ALMA.
O Observatório ALMA será inaugurado a 13 de março de 2013.
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Telm: +49 176 706 21 632
Email: maercker@astro.uni-bonn.de
Wouter Vlemmings
Onsala Space Observatory
Chalmers University of Technology, Sweden
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Email: wouter.vlemmings@chalmers.se
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Sobre a Nota de Imprensa
Nº da Notícia: | eso1239pt |
Nome: | R Sculptoris |
Tipo: | Milky Way : Star : Type : Variable |
Facility: | Atacama Large Millimeter/submillimeter Array |
Science data: | 2012Natur.490..232M |