Nota de Imprensa
Teorias sobre matéria escura comprometidas?
Novo estudo descobre falta misteriosa de matéria escura na vizinhança do Sol
18 de Abril de 2012
O estudo mais preciso sobre os movimentos de estrelas na Via Láctea não mostrou evidências da existência de grandes quantidades de matéria escura na vizinhança do Sol. De acordo com as teorias geralmente aceites, a vizinhança do Sol deveria estar cheia de matéria escura, a matéria invisível misteriosa que só pode ser detectada de modo indireto pela força gravitacional que exerce. No entanto, um novo estudo de uma equipa de astrónomos no Chile descobriu que estas teorias afinal não explicam os dados observados, o que pode significar que tentativas de detectar directamente partículas de matéria escura na Terra dificilmente serão bem sucedidas.
Uma equipa de astrónomos, utilizando o telescópio MPG/ESO de 2.2 metros instalado no Observatório de La Silla do ESO, juntamente com outros telescópios, mapeou os movimentos de mais de 400 estrelas até uma distância de 13 000 anos-luz do Sol. A partir destes novos dados, a equipa calculou a massa da matéria na vizinhança do Sol, contida num volume quatro vezes maior do que o alguma vez considerado.
"A quantidade de massa que calculámos coincide muito bem com o que vemos - estrelas, poeira e gás - na região em torno do Sol," diz o líder da equipa Christian Moni Bidin (Departamento de Astronomía, Universidad de Concepción, Chile). "O que não deixa lugar para matéria adicional - a matéria escura - que esperávamos encontrar. Os nossos cálculos mostram que a matéria escura deveria ter aparecido muito claramente nas medições. Mas afinal não está lá!"
A matéria escura é uma substância misteriosa que não pode ser vista, mas que se detecta pelo efeito gravitacional que exerce na matéria à sua volta. Este ingrediente extra do cosmos foi originalmente sugerido para explicar por que é que as zonas periféricas das galáxias, incluindo a nossa própria Via Láctea, rodavam tão rapidamente. A matéria escura é agora uma parte integrante das teorias que explicam como é que as galáxias se formam e evoluem.
Atualmente é geralmente aceite que a componente escura constitui cerca de 80% da massa do Universo [1], apesar do facto de continuar a resistir a todas as tentativas de clarificação da sua natureza, a qual permanece obscura. Até agora todas as tentativas de detecção de matéria escura em laboratórios na Terra falharam.
Ao medir cuidadosamente os movimentos de muitas estrelas, particularmente daquelas fora do plano da Via Láctea, a equipa pôde trabalhar ao invés na dedução da quantidade de matéria presente [2]. Os movimentos são o resultado da atração gravitacional mútua de toda a matéria, seja ela normal, por exemplo estrelas, seja ela escura.
Os modelos que existem para explicar como é que as galáxias se formam e rodam, sugerem que a Via Láctea esteja rodeada por um halo de matéria escura. Os modelos não conseguem prever exatamente a forma desse halo, mas prevêem encontrar quantidades significativas de tal matéria na região em torno do Sol. No entanto, apenas algumas formas bastante invulgares do halo de matéria escura - tais como uma forma extremamente alongada - poderiam explicar a falta de matéria escura descoberta por este novo estudo [3].
Os novos resultados também significam que tentativas de detectar matéria escura na Terra por meio das raras interações entre as partículas de matéria escura e as partículas de matéria "normal" terão poucas probabilidades de sucesso.
"Apesar dos novos resultados, a Via Láctea roda muito mais rapidamente do que o que pode ser justificado pela matéria visível. Por isso, se a matéria escura não está onde se esperava, temos que procurar uma nova solução para o problema da massa que falta. Os nossos resultados contradizem os modelos atualmente aceites. O mistério da matéria escura tornou-se agora ainda mais misterioso. Rastreios futuros, como os da missão Gaia da ESA, serão cruciais para avançarmos a partir neste momento." conclui Christian Moni Bidin.
Notas
[1] De acordo com as atuais teorias calcula-se que a matéria escura constitua 83% da matéria no Universo, encontrando-se os restantes 17% sob a forma de matéria normal. Uma maior quantidade de energia escura também parece estar presente no Universo, não se esperando, no entanto, que esta afecte os movimentos das estrelas no seio da Via Láctea.
[2] As observações foram obtidas com o espectrógrafo FEROS instalado no telescópio MPG/ESO de 2.2 metros, o instrumento Coralie montado no Telescópio Suíço de 1.2 metros Leonhard Euler, o instrumento MIKE montado no Telescópio Magellan II e o espectrógrafo Echelle instalado no Telescópio Irene du Pont. Os dois primeiros telescópios estão situados no Observatório de La Silla do ESO e os dois últimos estão localizados no Observatório de Las Campanas, ambos no Chile. Foram incluídas no estudo um total de mais de 400 estrelas gigantes vermelhas a alturas variáveis acima do plano da galáxia na direção do pólo sul galáctico.
[3] As teorias predizem que a quantidade média de matéria escura na região da Galáxia onde se encontra o Sol deva ser da ordem de 0.4 - 1.0 quilogramas de matéria escura num volume equivalente ao tamanho da Terra. As novas medições encontram o valor de 0.00±0.07 quilogramas por volume do tamanho da Terra.
Informações adicionais
Este trabalho foi apresentado num artigo científico "Kinematical and chemical vertical structure of the Galactic thick disk II. A lack of dark matter in the solar neighborhood", por Moni-Bidin et al., que será publicado na revista da especialidade The Astrophysical Journal.
A equipa é composta por C. Moni Bidin (Departamento de Astronomía, Universidad de Concepción, Chile), G. Carraro (European Southern Observatory, Santiago, Chile), R. A. Méndez (Departamento de Astronomía, Universidad de Chile, Santiago, Chile) e R. Smith (Departamento de Astronomía, Universidad de Concepción, Chile).
O ano de 2012 marca o quinquagésimo aniversário da fundação do Observatório Europeu do Sul (ESO). O ESO é a mais importante organização europeia intergovernamental para a investigação em astronomia e é o observatório astronómico mais produtivo do mundo. O ESO é financiado por 15 países: Alemanha, Áustria, Bélgica, Brasil, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Itália, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia e Suíça. O ESO destaca-se por levar a cabo um programa de trabalhos ambicioso, focado na concepção, construção e funcionamento de observatórios astronómicos terrestres de ponta, que possibilitam aos astrónomos importantes descobertas científicas. O ESO também tem um papel importante na promoção e organização de cooperação na investigação astronómica. O ESO mantém em funcionamento três observatórios de ponta, no Chile: La Silla, Paranal e Chajnantor. No Paranal, o ESO opera o Very Large Telescope, o observatório astronómico óptico mais avançado do mundo e dois telescópios de rastreio. O VISTA, o maior telescópio de rastreio do mundo que trabalha no infravermelho e o VLT Survey Telescope, o maior telescópio concebido exclusivamente para mapear os céus no visível. O ESO é o parceiro europeu do revolucionário telescópio ALMA, o maior projeto astronómico que existe atualmente. O ESO encontra-se a planear o European Extremely Large Telescope, E-ELT, um telescópio da classe dos 40 metros que observará na banda do visível e próximo infravermelho. O E-ELT será "o maior olho no céu do mundo".
Links
- Artigo científico: ApJ preprint.
- Fotografias do telescópio MPG/ESO de 2.2 metros.
- Fotografias do Telescópio Suíço de 1.2 metros Leonhard Euler.
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Sobre a Nota de Imprensa
Nº da Notícia: | eso1217pt |
Nome: | Dark Matter, Milky Way |
Tipo: | Milky Way Milky Way : Cosmology : Phenomenon : Dark Matter |
Facility: | MPG/ESO 2.2-metre telescope |
Instrumentos: | FEROS |
Science data: | 2012ApJ...751...30M |